quarta-feira, 14 de março de 2012

Reblogando - O choque veio depois

Eu escrevi esse texto pro Mâes Internacionais há alguns meses, mas eu acho q ele combina tanto com esse blog e como eu quero tê-lo registrado nos meus arquivos, aqui vai, de novo, pra quem não leu: 

Eu vim pra Israel 3 vezes antes da vinda definitiva – em janeiro de 2000 por 1 mês, depois de setembro de 2000 a junho de 2011 morei num kibbutz e finalmente em julho de 2003 por outro mês. Amava, adorava, idolatrava esse país. Assim, quando vim de vez em agosto de 2005, eu estava realizando um sonho.
Eu achava tudo lindo, tudo legal. Como eu já falava Hebraico (ou achava que falava) desde a 1a vez que vim, pois tinha feito todos os níveis da língua na Unicamp, eu não me sentia tão perdida no meio dos israelenses, eu me virava e  viajava sozinha pra cima e pra baixo sem problema algum, mantinha conversinhas básicas, comprava o que eu precisava…
Os problemas com a língua começaram a vir meses depois, quando eu aluguei meu primeiro apartamento. O Ariel estava no exército, tudo era por minha conta (as contas e os trâmites práticos mesmo). Uma coisa é você perguntar quantos quartos tem, quanto custam o aluguel e o condomínio. Outra coisa é entender o contrato e os termos que curso nenhum te ensina. Tive que ter fé nas pessoas e acreditar que não iam me tirar do apartamento (uma kitnet minúscula)  20 dias depois e que ninguém ia sumir com o meu dinheiro (o que, de fato, não aconteceu).
O mesmo pra todos os serviços que contratei – TV a cabo (praticamente não existe TV aberta), telefone, internet. Eu ligava nas prestadoras, achava que entendia tudo, assinava, pagava o que me parecia razoável e pronto. Nunca deixei de receber o serviço, é verdade, mas anos depois eu descobri que pagava taxas e mais taxas por coisas que nunca usei (porque provavelmente me explicaram e eu concordei).
Israelense não é um povo educado e refinado por natureza. A galera aqui se exalta e se irrita por nada, levanta a voz, é grosso, é mal educado, não sabe o que é fila, passa na tua frente sem vergonha na cara. Veja bem, não é, em hipótese alguma, um povo violento. A agressão é verbal mesmo, e nunca passa disso.  Israelense simplesmente não tem muito tato e fala o que dá na telha. Povo meio bronco, sabe?
Pois eu achava LINDO. Juro, eu achava autêntico, eu achava que toda a polidez do brasileiro era falsidade e o certo mesmo é não ficar de sorrisinhos e falar o que se precisa. Quando eu não achava lindo, achava engraçado. O povo brigava na fila do supermercado? Eu me matava de rir.
Mas esse romantismo passou. Não sei se é só comigo, mas eu acho que todos os 28 anos como brasileira deixaram em mim marcas que são mais fortes do q os 6 anos em Israel.
Eu passei 1 ano e 8 meses aqui antes de ir visitar minha família no Brasil pela 1a vez. Foram 20 meses intensos, de muitas conquistas, muitas mudanças, eu praticamente não vi o tempo passar. E foram 20 meses de paixão por Israel. Sabe aqueles primeiros meses de relacionamento quando até o ronco dele você acha bonitinho? Quando até a mãe dele é gente boa? Então, assim era a minha relação com o meu novo país.
Ai eu fui pro Brasil por 1 mês. E a realidade veio como um boom na minha cara. Eu, Luciana, gostava de sorrisos, gostava de simpatia de graça (sim, é legal você dar um sorriso e um bom dia no elevador). Eu nasci e me criei assim, né? De repente me dava vontade de abraçar todo mundo, aquele que me deu passagem na rua, aquele que me ofereceu ajuda pra levantar uma caixa nem tão pesada assim no supermercado, o garçom que se desdobrou pra me atender bem. E dai que na verdade ele queria uma gorjeta legal? E daí que era falso? Essas pequenas gentilezas fazem a vida mais leve, menos carrancuda.
Nessa viagem eu também percebi que não importa quantas amigas eu faça aqui. As amigas, amigas mesmo, estão no Brasil. Aquelas que cresceram juntas comigo, aquelas de quem eu conheço a mãe, o irmão e a tia de longe. Eu nunca terei amigas assim aqui em Israel, porque simplesmente os tempos são outros, a vida é outra. Porém, nessa viagem eu percebi também que muitos dos “amigos” que eu achava ter, faziam parte daquela vida que eu tinha deixado pra traz em 2005.
Nesse mês eu lembrei o quanto é bom ter família por perto, comida da mãe, conversa com a irmã, carinho da vó. Quando a gente tá longe, sente saudades, sente falta, mas a vida se faz sem essas pessoas e você vai levando. Aí surge o reencontro e você se pergunta como consegue viver e ser feliz realmente sem eles.
Esse foi o meu breaking point. Foi ai que eu deixei de amar Israel cegamente. Eu sabia o que os dois países tinham pra me oferecer e mesmo escolhendo ficar por aqui, eu já enxergava os seus defeitos como defeitos, e não mais como piada. Eu passei a aceitar suas imperfeições como num relacionamento onde, passada a paixão inicial, ambos os lados admiram as qualidades e aceitam as coisinhas chatas.
*****
Hoje, 6 anos e 7 meses após a minha chegada, eu acho que atingi o meu ponto de equilíbrio. Eu sei que não vivo num país perfeito, mas sei que o Brasil também não é. Odeio grosseria (mesmo sendo muito grossa quando preciso – hehe), adoro uma gentileza, mas não suporto falsidade e muito menos a leviandade de muitos brasileiros que conheço (“Oh, como faço? Minha babá não concorda em dormir na minha casa TODAS AS NOITES pra que eu possa ter a opção de sair com o meu marido quando der na nossa telha”. Ah,  quem dera fossem esses os meus problemas


Um comentário:

  1. Oi Lu,
    descobri teu blog por acaso e estou achando tao interessante que resolvi lê-lo desde o começo.
    Tenho 64 anos e vim morar em Israel há um ano e meio porque meu irmao, que mora aqui ficou com cancer e eu vim ficar com ele.
    nesse meio tempo ele faleceu e eu fui ficando.
    me encantei com tudo que voce se encantou, mas tudo que voce escreve é absolutamente verdadeiro e me identifico muito.
    a familia e os amigos longe (no brasil), a grosseria dos israelenses, a falta de refinamento, de um pouquinho de glamour acabaram pesando muito pra mim.
    o choque cultural com a familia daqui - estive em israel, antes, apenas nos casamentos e barmitzvas, nunca haviamos convivido no dia a dia - estao sendo muito penosos pra mim.
    no momento estou no brasil por uma semana pois estava morrendo de saudades da minha filha em sao paulo.
    meu dia a dia em israel é muito sem graça, e minha personalidade amistosa, gentil e calorosa (é exatamente como voce diz, o bom dia no elevador) foi ficando sufocada. ja estava cogitando voltar para o brasil e agora, em sao paulo, me decidi.
    minha vida aqui voltou a ser leve, extrovertida, gentilezas e sorrisos distribuidos para porteiros, vizinhos, até motoristas de taxi.
    aproveitei muito israel. aprendi hebraico direito, aprendi sobre a historia e as tradições judaicas, que nunca foram muito parte da minha vida em sao paulo. até um pouco da politica e dos conflitos internos entre haridim e hilonim.
    israel é um pais maravilhoso, com valores e uma alma muito semelhante à minha (nasci em tel aviv e aos 5 anos emigrei para o brasil com meus pais e lá vivi até um ano e meio atrás), mas nao consigo viver no meio das pessoas grossas, impacientes e sem educação que tem por aqui.

    te desejo muita felicidade a voce e tua familia e continue escrevendo pois adoro ler teus posts.
    um abraço,
    ahuva

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